O sentido das Brácteas

Erilaine Perez (galega.perez@gmail.com)

Aqui em Santiago o vento é gélido. Nossos rostos são como espadas nuas refletindo a palidez do frio. Pessoas levadas por essas ondas navegam pelas ruas, misturando à paisagem as cores de casacos e mantas de lã. É quase hora de almoço, mas prefiro escrever. O vapor da comida embaça as vidraças, então, sorvo um chimarrão que vai acalentando a sensação térmica e diminuindo a contração dos músculos.

Enquanto verdeja o amargo, lembro que sou gaúcha e, afinal, o frio também é causa para reflexões poéticas.

Um dia para meias três quartos sobre outras meias. Cabelos presos, porque atrapalham nas golas altas, botas, chocolate e viagens sem passagem marcada para o lugar mais aconchegante do planeta: o abraço! Apesar da agressividade do clima, as brácteas permanecem vulcânicas na soleira da janela. Penso que poderiam ter sido o motivo do vermelho na nossa bandeira sulina. Mesmo que não, para mim, elas têm sido uma fonte imarcescível de calor, enchendo meus olhos e meu coração de vida. Tudo mais que vive, parece agradecer ao gesto e, o toque, carrega em si novos significados, ainda que de forma inconsciente.

Paro por instante e internalizo os olhares carregados que, por mais que tentemos desviar, nos atravessam como o fio dessa espada gélida dos ventos.

Lembro do sentido das brácteas, socorro armazenado para uma cura que cauteriza com fogo e, por isso, também purifica as marcas. Assim, ainda que o inverno seja intenso, meu abraço nunca será contaminado pelo frio; resistirá quente como o colorido das brácteas.

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